quarta-feira, 27 de julho de 2011

Eu não presto, mas eu te amo

Ele era um daqueles sujeitos moderninhos, descolados, de barba por fazer, era até bem bonitinho. Sempre acompanhando a onda cult, culta, oculta, as festas e as feirinhas alternativas. Bem se amarrava em uma música independente, de artistas nobodies, e, apesar dos ares interioranos, sempre estava nos movimentos contemporâneos. Ela, bacana, mais vivida, linda de doer, um pouco mais velha. Descolada, independente, olhos ardentes, corpo perfeito, inteligente, cheirosa e, claro, contemporânea também. Apesar dos ares provincianos, sempre se revelava distante dos códigos sujos e dos nojentos mundanos. O irmão dele era bem diferente. Um cara “bem sucedido”, boa pinta, barba sempre feita, rostinho de bebê, um mauricinho. Tinha o carro do ano, morava no bairro dos novos ricos, casou com uma loira “exemplar” de um e oitenta (daquelas-todas-iguais-que-se-encontra-em-qualquer-esquina), comprou um rolex, um carro importado e tinha o emprego que todo pai pediu a Deus. Quer dizer, pelo menos os pais iguais a ele.

Num belo dia, naquele almoço de domingo na presença de toda a família, todas as tias fazendo crochê e os tios vendo o futebol da tarde, não teve jeito e acabou rolando aquele papo, o que não acontecia há uns dez anos. 

“E aí, como vão as coisas?”. “Vão bem, e com você?”. “Bem também. Comprei ação em mais algumas companhias, estou jogando críquete três vezes por semana, estou malhando na mesma academia daquela atriz da globo e, aos sábados, claro, transo com minha ninfa-deusa. Três vezes, obrigatoriamente. E você?”. “Bom, minha vida não anda tão agitada assim... Não malho, mas sempre vou para o mato. Compro insistentemente um maço de cigarro por dia, às vezes saio, às vezes não. Mas, o que eu tenho feito mesmo é conhecer gente. De tudo quanto é tipo. Recentemente, inclusive, conheci uma figura ímpar em uma dessas idas e vindas. Me apaixonei por uma mulher um pouco mais velha que eu”. “Ela já teve um longo relacionamento, mas a gente está se conhecendo”. “Cara, minha mulher nunca teve relacionamento. Eu é que a (co) rompi.” “É, a minha não...”. “Aliás, nem minha é. Ela é dela”. “Mas, vai aos mesmos lugares que eu, vira e mexe a gente se cruza, muitos amigos, assuntos e vinhos em comum”. “Estou gostando dessa história, acho que vai acabar (ou começar) bem”. “Meu irmãozinho, não se meta nessa roubada. Essa mulher, além de mais velha, deve ser uma puta! Se não casou até os trinta... sai fora! Bom mesmo é pegar mocinhas novinhas, recém-saídas do colinho do papai. Virgenzinhas santas!”. “É mesmo? Não sei... acho que não. Talvez não”. “Claro que é! Ela nunca deu para mais ninguém, só para o papai aqui. É o melhor sexo do mundo, faz tudo que eu mando!”. “É, a minha não... ela já namorou com outros, talvez com outras, experimentou diversas coisas, correu o mundo. Mas, mesmo assim, está me escolhendo”. “Acho que prefiro assim”. “Não, não acredito. E você já perguntou para ela se isso tudo é verdade? Se ela realmente te escolheu ou se é só curtição?”. “Sim, claro!”. “E o que ela respondeu?”. “Bom, no início era só curtição mesmo. Mas... eu também estou gostando bastante de você, lá se vai quase um ano, né? Mas, tenho que te confessar, eu não presto”. “Não falei! É uma puta!!! Não acredito que você vá em frente com isso, nunca terá futuro!”. “Mas vou, claro. O futuro sabe-se lá, quero viver é o meu hoje. Intensamente”. “E o que você disse a ela quando ela te contou isso?”. “Eu também não presto honey, mas eu te amo”. 


E, nessas idas e vindas, no prestar e não prestar, pelo sim, pelo não, até se separaram por um tempo. Mas, não tinha jeito. Depois, se reencontraram e ficaram imprestáveis juntos. Para sempre, pelo menos enquanto durar.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Um estranho no ninho

Era julho de noventa e cinco, um frio de matar naquela região remota do sul. Ele, que andava um pouco estranho com o mundo (e consigo mesmo) tinha saído com um amigo, que estava afim de um balacobaco. Decidiram então se embebedar, enlouquecer e madrugar. Ele estava tranquilo, despretensioso. Mas, o amigo, estava insano. Tinha que aturar. Altas horas da noite – que passou a ser tediosa -, conheceram uma sujeita e o amigo ficou o resto da noite a mascar, tentar, convencer. "Cara, que gata! Que boca, que papo, que linda!". "É...". A moça, nem tchum. Ele, sempre ficava mais de lado, na sua. Quase calado. Concordava com algumas coisas, com outras não. Ares de quem não queria novas amizades. Conversa vai, conversa vem, ela me solta um “você me acha bonita?”. “Em? Eu?”. “É, você. Me acha bonita?”. “Isso é pergunta que se faça?”. “Acha ou não acha?”. “Não, você é feinha...”. “Ahm???”. “Ué, só fui sincero. Quer dizer, você é linda e você, claro, sabe disso”. “Ah, agora você está falando isto só porque eu te pressionei”. Trocaram olhares estranhos, foram embora. Até hoje, ele continua se sentindo um estranho no ninho. Ela (provavelmente) também. E eles, juntos, nunca mais se estranharam.

domingo, 24 de julho de 2011

Desapego

Meio-dia. Eu queria estar na Bahia, na Cracóvia ou em qualquer sala vazia. Mas, vim parar na terapia. Sem desespero, sem agonia. Afinal, tenho uma tarefa que não é nada fácil, tampouco impossível. Dois meses lá se vão, quase quinhentos visitantes no blog e muitas dúvidas ainda me assombram. Sessenta dias de pura nostalgia e rebeldia. Uma quase esquizofrenia. Que doeria, eu já sabia. Mas que aqui não caberia, covardia.

Já falei de tentar, superar, esperar, viver, reviver, renascer. Ser. Já falei das minhas angústias, das minhas inseguranças e de quase todas as minhas andanças e lembranças. Sou praticamente um livro aberto, um vômito constante de todos os meus sentimentos. É hora de fechar. Mas, mesmo tentando por tantas vezes falar de alegria, sempre me vence a melancolia. E assim, repetidamente, vou seguindo dia após dia.

Minhas sensações têm se revezado entre energia, sofrimento, excitação e ansiedade. Estou cansado dessa intensidade. Queria ser mais leve, alienado, leviano, talvez assim fosse mais soberano. Estou exausto de ser só tédio, chego a querer jogar tudo no brejo. Enquanto todo mundo espera alguma coisa de um sábado à noite, eu continuo não esperando nada. Tem gente morrendo, gente matando, gente roubando, gente amando e gente vivendo. Mas eu, apenas escrevendo. Tenho me alternado entre posts rápidos de poeminhas bobos e textos densos de sentimentos tolos. Acendo os refletores, eu mesmo alugo os meus próprios leitores. Saio à noite, procuro nos estranhos uma afetividade que me mova. Mas, logo eu mesmo me estranho e saio correndo à francesa antes que qualquer um me veja. E isto tem se repetido com tanta constância, que chega a me dar até ânsia.

Alguns pensam que os meus chapéus são para esconder a calvice. Mas não, são para me transfigurar, modificar, tentar essa mente realçar. Alguns pensam que os meus cabelos brancos estão vindo da ansiedade. Mas não, esses sim é que vêm da velhice. Alguns pensam que eu deva voltar a cozinhar, a degustar. Mas não, não tenho saliva e nem paladar. Alguns pensam que escrever só me fará sofrer. Mas não, tem me ajudado a ser. Alguns pensam que é fácil lidar. Mas não, é uma matéria delicada até de se pensar. Alguns pensam que estou cavando a minha própria cova. A estes, eu digo: uma ova!

Alguns amigos dizem que o que eu preciso mesmo é viajar, outros dizem que o que eu preciso é me acalmar, deixar estar. Mas, talvez, o que eu precise mesmo é de uma boa dose de desapego. Para me libertar.

sábado, 23 de julho de 2011

Minha floresta encantada

Rastejo como uma cobra
Trovejo feito um leão
Ladro feito um cão
Vôo feito um fênix
Transmuto como um camaleão

Canto feito um bem-te-vi
Escuto como um golfinho
Como uma coruja, fico no ninho
Flano como um passarinho
Mergulho como um leão-marinho

Vivo feito um gato
Grudo igual carrapato
Como um cavalo, me pego a cavalgar
Como uma sereia, tenho o meu próprio mar
Sou uma salada de bichos, ei de tentar sonhar

Na minha floresta, eu sou meu próprio rei
Não tem maestro, apenas o que imaginei
Os tucanos tocam violino, as araras usam terno-linho
As andorinhas, as camélias e os trompetes formam uma orquestra
Fazem poesia
Aqui, é festa todo dia.



sexta-feira, 22 de julho de 2011

Eu. Vivo.

Vivo de inseguranças, certas andanças, algumas lembranças.
Vivo de tentar voar, me arriscar, algumas danças.
Em tempos de mudança, o bom mesmo é ser criança.
Me apego às lanças.
Manchas.

Vivo de tentar fugir, me iludir, pensar em partir.
Vivo de te seduzir, enaltecer, até cair.
Em tempos de me descobrir, o bom mesmo é correr e rir.
Me apego a sentir.
Sair.
Ir e Vir.

Vivo de amadurecer, estremecer, enlouquecer.
Vivo de tentar crescer, reconhecer e florescer.
Em tempos de tentar só ser, o bom mesmo é espairecer.
Me apego ao amanhecer.
Crer.
Felicidade ser.

Vivo de tentar andar, só, me embasbacar.
Vivo de telefonar, até cansar, sem apanhar.
Em tempos de me descansar, o bom mesmo é respirar.
Me apego apenas ao meu lar.
Flutuar. Acalmar.
Aliviar.

Vivo de me encantar, me iludir, me rebelar.
Vivo de tentar buscar, tentar sonhar, me chamegar.
Em tempos de me isolar, o bom mesmo é viajar.
Me apego a arrebatar.
Esperar. Planar.
Cantar.

Vivo de me plagiar, me enganar, me sabotar.
Vivo de tentar me ver, me procurar, sem alcançar.
Em tempos de tentar viver, o bom mesmo é esquecer.
Me apego a me reinventar.
Reviver.
Renascer.




quinta-feira, 21 de julho de 2011

O meu amor

O meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim é peculiar
O meu amor não está em qualquer esquina, não é fácil alcançar
O meu desejo não é apenas amar
Talvez pense, ele enlouqueceu
Não, o meu amor sou eu

O meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim não faz revelar
O meu amor não está nas plateias dos teatros, não é fácil imaginar
O meu desejo não é apenas sofrer
Talvez pense, ele cresceu
Não, o meu amor é seu

O meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim faz calar
O meu amor não está nos gibis, nos livros e nas revistas, não é fácil tentar
O meu desejo não é apenas sentir
Talvez pense, ele cedeu
Não, o meu amor não é só seu

O meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim faz a cabeça estourar
O meu amor não está nas insônias, nas noites divertidas, não é fácil pegar
O meu desejo não é apenas planar
Talvez pense, ele temeu
Não, o meu amor sempre foi meu

O meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim faz sonhar
O meu amor não está nas mesas, nos edredons, não é fácil achar
O meu desejo não é apenas transar
Talvez pense, ele rendeu
Não, o meu amor correu

O meu amor até “tem um jeito manso que é só seu”
Mas, o meu amor é só meu
O meu jeito de amar, a mim fará voar
O meu amor nunca estará nesse plano, não é terreno, não é fácil buscar
O meu desejo não é apenas achar, ficar ou voltar
Talvez pense, ele morreu
Não, o meu amor viveu.



terça-feira, 19 de julho de 2011

Objetivos


Os meus objetivos do ano eram:


- Entrar para a terapia
- Parar de fumar
- Fazer uma tatuagem
- Atingir 5.000 visitas no blog

E, hoje, inesperadamente e despretensiosamente, mas, incrivelmente, atingi um objetivo que carregava comigo há 10 anos: o meu peso de quando tinha 15.

Por dentro, ainda me sinto gordo, um lixo, despreparado. 
Mas muito mais bem disposto para atingir os (agora) novos objetivos. Vou tirar de letra.

#igualpintonolixo

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Ser


Tenho um milhão de coisas para fazer, mas só consigo escrever.


Tenho um vinho para acabar, uma frieira para sarar, um curso para matricular, a louça para lavar, os quadros para emoldurar, o cigarro para largar e uma parede para decorar. Um mergulho para dessalar, alguns amigos a reencontrar, um peito para cicatrizar e um mundo inteiro para tentar mudar.

Mas, só consigo escrever. E escrevo tanto, que chego a achar que finjo. Finjo ser eu mesmo e estar inspirado, levemente desarmado. Escorraçado. Tento fugir das rimas, mas as danadas me perseguem (e como conseguem). E, antes mesmo que eu me perceba, continuo rimando e procurando. Mas, procurando o quê? Afinal, essa pseudo-fantasia de que tudo ainda dará certo e que um dia vou encontrar aquilo que supostamente busco, acaba se virando contra mim. Uma armadilha de mim mesmo, das minhas falácias, das minhas angústias e dos meus falsos sonhos.

Àquele que nada quer, meus cumprimentos. Vazio é querer tudo (incrivelmente, ao mesmo tempo) e não saber absolutamente nada. E querer, é fato, exige um esforço sobremaneira sacrificante. Ilusão.

Nessa intensa busca por querer (e querer encontrar), chego a ter certeza de que devo parar. Desistir de tentar tentar. Dar um tempo, nos permitir calar e falhar. Tenho um milhões de coisas para fazer, mas agora não há como nem crer. Vou parar de correr e (re) começar por aqui: ser.

domingo, 17 de julho de 2011

Naquela tarde de domingo...

Aquela tarde de domingo já não era como as outras.
Eu sentia, estava em vão.
Tesão, paixão, sem ereção.
Temor, pavor, reconstrução.

Me reconstruo sem ódio, melancolia meu ópio.
Sobrevivo, mas vivo.
Solo, sóbrio, remoto.

Naquela tarde de domingo eu já sentia.
Tem disso sim, partir.
Não dá pra rir.
Só ir. 

Várias vezes censurado, tanto quanto angustiado.
Naquelas noites em que eu ia sozinho, só ficava parado.
Eu tentava e você fudia.
Não ia. Não podia.

Haja hoje, para tanto ontem.
Queria que fosse anteontem.
Não terei mais carnaval. Só maremoto e vendaval.
Das cinzas, voltarei. Desse universo, serei rei.

Ainda é tarde de domingo. Acorda, vem me buscar. 
Quero entender, compreender, quero tentar.
Sou diferente de ninguém, só não posso ser igual.
Estou sem ego, não consigo. Penso, agora, era carnal?

Naquela tarde de domingo, eu precisava de calor.
A cafeína é meu motor.  
A minha insônia, um rigor.
A paixão é minha dor.
Onde estará aquela flor?



quinta-feira, 14 de julho de 2011

(in) consciência

Ele queria ser grande e maduro, sem pensar no futuro.
Queria um mundo mais divertido e colorido.
Que todas as semanas tivessem dois sábados.
Que estivesse perto do mar, para se renovar.
E que não fumasse, mas mesmo assim planasse.

Ele queria tocar as nuvens e viajar de balão.
Poder andar sozinho, com os pés no chão.
Queria ser uma pulga, sem que tivesse uma ruga.
Que gentileza fosse pura e gratuita.
E o seu coração, da dimensão de uma gruta.

Ele queria mais flerte, mais beijo e paixão.
E que as trocas de olhares nunca fossem em vão.
Ele queria pra si o universo inteiro.
Não que seja egoísta, só lhe faltava roteiro.

O mundo está à sua frente, mas não consegue mexer.
Quem dera o poder do tempo, ele pudesse ter.
Queria se embebedar, enlouquecer e correr.
Ele queria calar, enrijecer e crescer.

Ele queria um vaso, para as ideias plantar.
Queria também um lápis, para poder escrever.
Porque quanto mais ele se rende, mais escreve.
Quanto mais escreve, mais quer.
Quanto mais consegue, mais se entrega.
E quanto mais se entrega, mais relega.
 
Ele queria estar no meio da rua, para gritar.
Ou apenas na chuva, para molhar.
Ele queria asas, para voar. 
Também queria uma faca, para se tatuar.
Depois tomar um bom porre, para cicatrizar.
E aí então um bom balde, para si vomitar.

Ele queria uma cama, para se deitar.
E o ar puro do mato, para respirar.
Ele queria esperança, para acreditar.
Que era apenas um sonho.
Para acordar.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Aquela Copa de 2006...

Alto verão europeu, julho de 2006. No Brasil, férias escolares e um frio de matar. Na Alemanha, a Copa já estava quase completando um mês. E a nossa seleção, que vinha empolgada do pentacampeonato na Coréia e no Japão, em 2002, já havia atropelado Croácia, Austrália, Japão e Gana. Aquele time dava vestígios de que era realmente fantástico. O famoso “quadrado mágico”, formado por Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Adriano e Ronaldo – que naquele momento já havia se tornado o maior artilheiro da história das Copas – vinha encantando a todos e a todas.

Era um sábado lindo, de céu azul e poucas nuvens, tínhamos a França de Zidane pela frente. É, aquele mesmo que, oito anos antes diante de sua torcida, em pleno Stade de France – quando Ronaldo teve sua famosa “convulsão”, que mais tarde ficara conhecida como “síndrome do Bial” –, acabou com o sonho canarinho do penta. A revanche era esperada, o cenário era perfeito. E eu lá, empolgado na beira do rio com os amigos, os intrusos e a família. A festa pronta, as velhas TVs espalhadas pela casa e a faixa pendurada na entrada anunciavam: iria ser um grande dia. Todos bebiam, interagiam e se divertiam.

Quando o jogo começou, olhares atentos, pupilas dilatadas, manias observadas. Um ficava de costas, o outro vestia a camisa do tri, um terceiro a do tetra e a moça, que se revelava ansiosa, uma bandana na cabeça. Um primeiro tempo muito acirrado e disputado. Algumas canetas de Kaká, umas derrapadas de Ronaldo (que na época já estava gordinho, imaginem...), vários chapéus de Zidane. É, um 0x0 angustiante. Início do segundo tempo, o Brasil volta com a mesma formação, alguma coisa estranha acontecia. O Cafu furou umas duas, o Lúcio deixou passar algumas, o time todo voltou apagado. Menos ele: Zinedine Zidane, o Zizou. Aos 12 minutos, numa bola certamente despretensiosa, viria o lance decisivo. Bateu uma falta na meia-esquerda e pegou Thierry Henry – que esteve apagado em todo o primeiro tempo – livre na segunda trave: gol da França. E o Roberto Carlos, coitado, nem viu o gol. Estava ajeitando a meia...



E foi assim até o final do jogo, um sofrimento só. O segundo tempo acabou, o jogo acabou, a Copa acabou. E eu chorava, chorava e chorava. Inconsolável. Afinal, “a pátria estava nas pontas das chuteiras”, seriam quatro longos (e infelizes) anos pela frente. Quanta angústia em ter que esperar essa trupe novamente. Ficaria um vazio, era mesmo o fim do mundo. Foi quando, de longe, escutei algo semelhante a “não ligue, isso é só futebol. É apenas um jogo, a vida continua”. Putz, como assim alguém vem me falar isso nessa altura do campeonato? “Alôôu, alôôu, o Brasil acabou de perder a Copa. Vou suicidar, quero morrer. Você é o demônio, sai daqui!”. E eu é que saí, me isolei por alguns instantes. Mas (pausa para pensar), subitamente me veio aquela sensação do tipo: “e daí, é realmente só futebol”. Os passarinhos continuavam a cantar, o céu ainda estava azul e todo mundo ainda estava bebendo e cantando. E feliz, claro. Então, pensei comigo mesmo se não deveria ser mais eu, cuidar das minhas coisas e dos meus círculos. Passei a cogitar severamente que o futebol seria, de fato, fútil diante das reais importâncias do mundo. Relutei por mais alguns minutos, mas concordei. Me desliguei.

Tempos depois, o Roberto Carlos ainda seria taxado de carrasco por aquela perda. Logo ele, que também havia sido penta em 2002 e, anos antes, conseguira a proeza de ser eleito o segundo melhor jogador do mundo como lateral esquerdo. Também né, foi comprar uma meia frouxa logo para a Copa, já viu. Naquela mesma Copa, Zizou ainda nos proporcionaria um dos lances mais inusitados de todos os tempos. Em plena final, contra a Itália, ouviu sua irmã ser chamada de puta e não pensou duas vezes antes de dar uma bela duma cabeçada no Materazzi. Coitado do Materazzi. Ganhou a Copa, mas ganhou também um roxo na barriga, perdeu a piada, a razão e ainda viu a legião de fãs de Zidane só aumentar...

E o Henry? É, o Henry. Mal sabia ele que, ali, sacramentava o meu total desencantamento com a bola e começara outra (e nova) vida. Desarmado, despreparado, entusiasmado e com o futebol de lado.

Hoje, é claro, ainda gosto muito. Vou para o buteco, assino campeonatos, me enlouqueço com o Cruzeiro e acho fantástica a paixão atleticana. Conheço os times, os treinadores, os jogadores, os reservas e até os comentaristas. Me diverti vendo o Santos de Neymar ganhar a Libertadores e parei para ver o Fla-Flu em pleno carnaval. Mas Henry, de fato, me arrancou esse cordão umbilical.


segunda-feira, 11 de julho de 2011

O meu vício

Meu vício, meu veneno, minha alma.
Desespero. Quero calma.

Nunca imaginei que me livrar de ti seria tão difícil. Sofro diariamente só de pensar. Mas, devo cair na real. Afinal, o tempo vai passar e terei que seguir em frente, te esquecer definitivamente. Devo, não nego. Tento e não me entrego.

E como dói. Dói só de pensar que esteve comigo em quase todos os momentos. Nos bons, nos maus e até nos médios. Na minha carreira, nas maiores conquistas e em todas as vezes que chorei ou explodi de alegria. Quando formei, quando arrumei o primeiro emprego, quando perdi o segundo, quando me promoveram e até quando ganhei um novo. Quando conheci os lugares mais incríveis, a Lapa, Santa Tereza, Cabeça de Boi e em todas as vezes que eu vi o sol nascer ou o muro mexer. Naquelas noites melancólicas que não consegui dormir. E até naquelas que dormi, você estava ali.

Confesso ser difícil aceitar que esta relação tenha tido tantos altos e baixos e que vá acabar dessa forma. Já fiquei amargurado de te ver, já te quis bem longe de mim. Mas, mesmo quando a gente brigava, o retorno era compensável. Todas as vezes que te procurei valeram a pena. Te ver depois de certo tempo, é verdade, era uma sensação inigualável. Não me arrependo de absolutamente nada.

Chego a carregar comigo a certeza de que, na sua ausência, não conseguirei seguir. Lamento muito. Afinal, com você o Central Park foi mais tranquilizante, o tédio de Miami ficou mais distante, a noite carioca mais contagiante, Buenos Aires mais apaixonante e a casinha de Boipeba mais aconchegante. Desespero-me quando você não está em casa. Olho os quadros, a mesa bonita de Tiradentes, as paredes coloridas e a minha televisão gigante. É desconcertante.

Das minhas despedidas, essa certamente será uma das piores.

Minha eterna parceria, se traduz em calmaria.
Você me dá prazer, sem você não viveria.
Meu vício, meu veneno, meu alívio, minha calma.




Marlboro. 
Alimenta a minha alma.

domingo, 10 de julho de 2011

Para uns, para outros

Amigo, estou contigo.
Pra você, sou companhia, simpatia e alegria.
Sou sereno e sou pleno.
Dou meus braços, sou ouvidos, me disponho.
Eu até sonho.

Para outros, eu sou médio, sou freguês, sou solução.
Para uns, sou perdição. Para outros, digo não.
Para uns, eu sou a festa. Para outros, uma fresta.
Para uns, ignorância. Para outros, sou infância.
Eu sou a terra, o fogo e o ar.
Sou paixão e sei calar.

Sou prisioneiro de mim mesmo, os dois lados da moeda.
Para uns, eu sou a língua. Para outros, uma míngua.
Para uns, eu sou deserto. Pros amigos, sempre perto.
Aberto.

Para uns, eu sou Leozito. Para outros, nem apito.
Para uns, eu sou Leozinho. Para outros, sou carinho.
Pra Dindinha, sou querido. Pra vovó, eu sou Leléo.
Para a Duda, sou Beltrix. Pro Chitão, eu sou Beltrônico.
Pra Batatinha, eu sou o Belt. Pro André, sou Leonardo.
Para o Lucas, sou careca. Para o Fred, eu sou Jones.
Pro Diego, sou Beltrones. Pro Matias, é Léo Jones.
Pra minha mãe, eu sou Leozoca. Pro meu pai, eu sou filhote.
Para a Ziza, sou só Beltris. Pro Miguel, eu sou Leozão.
Sou Da Vinci pro Biel. Pra maioria, sou só Léo.
Pro Geraldinho, sou patrão. Pro Alan, Be-Be-Beltrão.

Para uns, eu sou o caos. Para outros, sou o fim.
Para alguns, estou aqui. Pra Carol, eu sou Beltim.
Já fui pequeno, lindo, amor. Mas, pra mim, sou só assim:
Livre, leve e solto.

Queria ser um marinheiro, para poder navegar.
Queria ser um bombeiro, para poder salvar.
Queria ser cozinheiro, para saborear.
Um carro, para buzinar. Um pandeiro, para sambar.
Queria ser carteiro, para lhe entregar.
Ser bicicleta, para andar.
Queria ser câmera, para gravar.
Um lampião, para iluminar.
Queria ser microfone, para cantar.
Um poeta, para aliviar.
Ou simplesmente um quadro, para emocionar.
Mas, para uns eu sou metade. E para outros, saudade.


Multifacetas fazem parte de mim. Minha mente é ebulição.
Sou carona, vou à lona.
Sou o meu eu, também sou seu.
Sou só meu, de mais ninguém.
Minha angústia me cai bem.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Hoje

Hoje eu quero um reencontro.
As pupilas dilatadas, a ressaca.
A louca vontade de dirigir, os óculos escuros.
As buzinas incessantes.
A sensação de não dormir.

Hoje eu quero um reencontro com a luminosidade e a poesia.
A métrica carnal, minha tormenta, o meio-dia.
A blusa azul, o meu chapéu, a sala fria.
Um reencontro com a minha boemia.
Eu quero ver e quero crer.

Hoje eu quero um reencontro triunfante.
Gente gritando. Liberdade, ainda distante.
Eu quero um sol que brilhe e a chuva pra dançar.
Eu quero ver os sonhos. Vontade de vingar.
Mesmo ácido, pois bem, o tempo passa.
A redenção já vem.

Hoje eu quero um reencontro com a magia.
A rua está vazia e mesmo assim eu vou.
Não vou bater a porta.
Eu quero a madrugada, ver a noite enluarada.
Eu quero atenção. Mas bem, agora não.
Ainda vou buscar, um dia alcançar.
Não há mistério algum, só vou.

Hoje eu quero um reencontro com o passado.
Não sou mais tão jovem, sou o meio.
Nostalgia me permeia.
Não quero mais chorar, o leite derramar.
Alguns sintomas, os cabelos brancos e a careca prenunciam.
É velhice, o prelúdio dos tempos.
Aqui há paz tardia.

Hoje eu quero um reencontro com meu corpo.
Ele pede, mas já doem os joelhos. É tanto andar.
Os olhos lacrimejam de tanto olhar e, o umbigo, um tanto frio.
Os pés descalços só deslizam no vazio.

Hoje eu quero um reencontro só comigo.
Desfigurado e desconfigurado.
A minha cafonice confessa, ser paisagem é pesar.
Deixa estar.
Estou cuspido, escarrado. Mal criado.
Um réquiem de mim mesmo.
Refém.

Hoje eu quero um reencontro sem encontro.
Sem melancolia, sofrimento. Sem angústia.
Isto, claro, me frustra.
Mas não, não dá para voltar.
Vagar. Devagar. Reencontrar.
Sem parar.


quinta-feira, 7 de julho de 2011

Sóbrio e só

Ando meio desligado. Meio desatualizado. 
Meio fora de órbita. Meio fora de si.
Há tempos, eu sou Chico. Só Chico. 
Em hora boa, até cai um Vinícius.
Em hora brega, Roupa Nova.
Em hora triste, cai Cartola.
Mas, indubitavelmente (e insistentemente), Chico.


E, como é hora de me renovar e me reconectar, fui procurar.
Essa semana, conheci essa parada.
Sei lá sei gostei tanto assim, mas não tenho dúvida: 
Não mudo nada!
A casa caiu

Ou me mudo
Ou me caso
Ou me acabo em álcool

Algo que faça sentido
Algo que me traga alívio
Estou tão sóbrio e só

Meu mundo acabou
Ou me mato
Ou me trato
Ou me acabo em álcool

Algo que faça sentido
Algo que me traga alívio

Estou tão sóbrio e só
Estou tão sóbrio e só
Estou tão sóbrio e só
Estou tão só

Com você por perto
Ou me calo
Ou te bato
Ou me acabo em álcool

Algo que faça sentido
Algo que me traga alívio
Estou tão sóbrio e só

A casa caiu
Ou me mudo
Ou me caso
Ou me acabo em álcool

Algo que faça sentido
Algo que me traga alívio

Estou tão sóbrio e só
Estou tão sóbrio e só
Estou tão sóbrio e só
Estou tão só

Cérebro Eletrônico (Música: Sóbrio e só / CD: Deus e o Diabo no Liqüidificador)

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Timidez

Às vezes, tenho absoluta convicção de que sou tímido.
É, sou tímido.
Afinal, a timidez não está simplesmente no fato de ser inibido.

Crio blog, falo em público, dou aula.
Me declaro, mas sou tímido. E que mal há nisso?
A timidez está em tudo. Nos gestos, nos atos e até na falta deles.

É. Sou chefe, coordeno, sou amigo e até inimigo.
Mas me calo.
E se quem cala consente, minha palavra é o silêncio.

Às vezes, até a mesa de bar me trava.
Uma reunião me cala, um comentário indigesto.
Flagra.

Dos tímidos, talvez não seja o mais intenso.
Disfarço bem. Garanto.
Mas que existe uma timidez oculta e aguçada dentro de mim e que às vezes aflora...
Ah, isso existe!

Se estou feliz, quero gritar.
Se está legal, quero falar.
Se estou na boa, quero amar.
Se estou por cima, faço calar.
Se estou voraz, tanto faz.
Se estou amigo, pego a mão.
Se estou bem, sei dizer não.

Mas, a timidez me cala.
E aí, fico na vala.

Meus sentimentos, às vezes invento.
Meu posicionamento, às vezes é vento.
Se precisar, até aumento.

Faço rimas pra chamar a atenção.
Sou poeta? Não, só canastrão!
Não tenho dúvidas que quase nunca é em vão.
Óbvio que não.
Mas minha fala disfarçada e esse jeito despojado... sei não.

Faço pose de bacana. Mas um dia, vou em cana.
Falso tímido, não sou. Desenvolto, também não.

Umas vezes desalmado, em outras descolado.
Ser tímido faz bem, não disfarço pra ninguém.
Sou um ser transfigurado e revoltado.
É, tá bem.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Paisagem

Tão perto, tão longe.


Na minha janela, só uma paisagem.
Uma árvore, um pintor e um vizinho.
A árvore é verde, o pintor ouve Raúl.
E o vizinho anda nu.

Minha parede é amarela e o pintor lá na janela.
O vizinho vê a mesa.
E a árvore é presa.

Tão perto, tão longe.
Sem angústias, sem pensar.
O que será se passa lá?

O pintor, horas ali. O vizinho, sempre ali.
A árvore não fala. E eu? Estou aqui.

Na janela do outro lado, um vazio e o céu.
As abelhas buscam mel, a moça vê seu véu e o tio olha pro céu.

Tão perto, tão longe.
Sem angústia, sem parar.
Tão longe, tão perto.
Incerto.

Na paisagem do meu quarto não tem Lô, não tem esquina.
Não tem mel e nem tem véu.
Só parede e escarcéu.
Tenho amigo que é réu. Tenho outros lá no céu.

O pintor e o vizinho são amigos. Não sabia.
A moça e o tio se namoram. Agonia.
As abelhas e a árvore trocam charmes noite e dia.
Meus amores, meus amigos, ironia.

Tão perto, tão longe.
Sem angústia, sem pensar.
Sem delongas, sem parar.
Tão longe, tão perto.
Incerto.

Todas as conexões estão ali.
E eu, estou aqui.
O mundo é imperfeito.

Tão perto, tão longe.
Apenas daqui.

A paisagem interage. 
O espectador, nem age.