quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Curtas da enfermaria

Doutor, eu tô doente. Me cura? Mas, você tem o que meu jovem? Muita dor. E dor de quê? De amor. Alguém te largou, o seu amor te deixou? Não, doutor, fui eu.

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Doutor, eu queria que você costurasse o meu peito. Não há como, meu jovem, você está bem e o seu peito não tem nada. Está intacto. Tá aberto doutor, você não tá vendo? Olha direito! Olha! Estou olhando, não tem um arranhãozinho sequer, é só a sua imaginação. Mas, dói tanto doutor, o meu peito precisa cicatrizar. Está sofrendo de amor, meu jovem? Sofrendo não, acho que essa fase já passou. Mas, e mesmo assim o peito ainda não fechou? Não, doutor, é que agora tudo voltou. Rasgou.

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Oi doutor, bom dia. Eu vim me curar. Diga, meu filho, o que você tem? Bom, na verdade, outro dia eu voltei a sonhar e, no final do sonho, com um tiro certeiro na cabeça, eu morri. E depois eu levantei assustado, vi que o mundo todo continuava à minha volta, as veias palpitando, o noticiário da manhã anunciando... Que bom, meu filho. Às vezes sonhar é ruim, mas é só um sonho. Passa. E, me diga, por que quer se curar? Porque acordei.

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Doutora, a minha mulher me largou, eu achei que estivesse bem, mas hoje eu acordei com uma vontade muito grande de morrer. Que isso, não fique assim, sofrer faz parte. Jajá passa. Ah, é? Passa quando? Não sei, às vezes leva alguns meses, às vezes anos. Mas, eu não vou aguentar doutora, quero que passe rápido! Não é assim, tão fácil, tenha paciência que uma hora passa. Doutora, me falam isso todos os dias. Os amigos, os conhecidos, os colegas de trabalho... É, meu filho, passa. Uma hora passa. Ah, entendi. Já é meio-dia e quarenta, posso esperar aqui?

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Doutor, qual remédio que é bom para curar esse meu sofrimento de amor? Não tem nada, meu filho, é só o tempo mesmo. Então me dê duas caixas, por favor.

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Doutor, eu quero voltar a dormir, eu daria até o meu rim. Meu filho, eu vou te dar um remedinho. Não, doutor, isso eu já tentei no outro médico, o seu vizinho aqui, e não deu certo. Então, meu filho, eu vou te receitar alguns exercícios e uns chazinhos calmantes. Não, doutor, isso eu já tentei também. E o que mais você já tentou, meu filho? Bom, na semana passada eu tentei beber. Foi difícil, não funcionou. Anteontem eu tentei ler, mas também foi difícil, não funcionou. Já, ontem, eu não usei nada. E conseguiu? É, consegui. E porque quer algum tipo de tratamento? Porque se eu conseguir de novo, é porque eu vivi. E isso não é bom, meu filho? Não, porque eu prefiro dormir pra sempre do que acordar assim de novo. Assim como, meu filho? Morto.

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Doutor, bom dia. Hoje eu vim fazer uma operação de redução. Eu sou cardiologista, meu filho, você veio ao médico errado. Vou te reencaminhar. Não Doutor, é aqui mesmo. Eu não quero redução de estômago, já estou bem magrinho. Eu quero redução de coração, tem como? Não, isso não tem jeito, você morreria. Por que você quer isso? Porque ele é muito grande, tem muita coisa aqui que eu quero jogar fora. O quê, por exemplo? O meu amor, a saudade, a tristeza, as lembranças. Mas, meu filho, isso não está no coração, está na sua cabeça. Entendi, doutor. Me empresta então seu bisturi?

Um comentário:

  1. "Eu sei que dói. É horrível. Eu sei que parece que você não vai agüentar, mas aguenta. Sei que parece que vai explodir, mas não explode. Sei que dá vontade de abrir um zíper nas costas e sair do corpo porque dentro da gente, nesse momento, não é um bom lugar para se estar." (eternamente, Caio)

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