quarta-feira, 9 de novembro de 2011

um pouco estranho

hoje eu acordei um pouco estranho. de novo. deve ter sido por ontem. a agenda intensa, reuniões atrás de reuniões, alguns cafés e alguns cigarros, um pouco menos que antes, o almoço com um dos grandes amigos, algumas descobertas surpreendentes, outras nem tanto, eram confirmações, depois telefonemas, palavras ríspidas e uma angústia fragmentada em parte da tarde. algumas trocas singelas de olhares no trânsito, uma rápida discussão com o síndico sobre o décimo terceiro da faxineira do prédio, um banho de meia-hora, tive que trocar o chuveiro, pois queimou, depois voltei, prendi um dos quadros e depois fiz a barba, pela metade, deixei por fazer. depois assisti a um show lindo do chico, esse mesmo aí de baixo, foi demais, mas não desmaiei, lá estavam também os melhores amigos, cantei quase todas, sorri, me recompus, e depois uma cerveja. algumas, muitas, até cair. um prato da pesada, carne, uma mesa de músicos ruins e feios, nobodies, mas moças bonitas, era esquisito, mas era divertido também. e depois a despedida, o silêncio da madrugada, sozinho, e então um sonho bem leve, manso, muito embora tenso e tumultuado.

está tudo um pouco diferente, estranho, porque hoje eu acordei antes da hora, antes do despertador, pela primeira vez em meses eu o trapaceei, não sei se é bom ou ruim, descobrirei mais tarde, eu acordei também com o livro de cabeceira em cima do meu peito, não me lembro muito bem como ele foi parar ali, não me recordo de ter lido, mas lembro-me de cada detalhe, minuciosamente, de ontem à noite, do dia inteiro, apenas desse que não. mas não é cruel, só é bizarro. é obscuro, eu tenho dúvidas. então eu resolvi escrever com minúsculas, pois na dúvida, como sempre, eu prefiro variar. estou no diminutivo, como elas, mas não nas dimensões, só na clareza, na simplicidade e nas arrumações. pequenas diversões. hoje eu resolvi arranjar uma música, mas eu não sei fazer isto, então desisti, vou trabalhar, escolhi um tênis vermelho e uma blusa amarela descolada para dar bandeira, pois hoje eu posso, ao invés das calças bem passadas e com frisos, das camisas listradas de botão e dos sapatos caretas da semana passada, pois não podia, eu tinha reuniões políticas, parecia um mauricinho. mas hoje não, hoje eu sou eu. de novo.

devo fumar mais uns cigarros e tomar outros cafés, um pouco menos que ontem, espero, usar palavras mais doces, dóceis e sorrir para os colegas, vou pular os telefonemas amargos e, depois do trabalho, ainda um pouco sujo e cansado, devo ir a algum bar bem ruim, saca, tomar uma de salinas, marcar presença nos tricotes semanais e depois fugir do síndico. hoje ele não me pega nem a pau. hoje também não tem jogo bom na tevê, deve ter algo do tipo vasco e paysandu, do tipo que não me pega, então vou alugar um filme, passar na padaria do maurinho, e se estiver fechada vou na do manoel ali na esquina, comprarei umas empanadinhas falsas argentinas, ele sempre me engana, e uma coca. vou tomar os meus remédios, são nove, canso só de pensar, depois vou assistir só ao trailer de um dos trailers do filme que eu aluguei e que eu vou querer alugar depois só para ver o trailer do filme do trailer, de um outro, e assim por diante, e depois vou dormir de barriga para cima e sonhar com paris, com mozart, com chico ou com cartola, e no outro dia eu nem vou me lembrar. espero que não.

e nesse outro dia, que será amanhã, e será diferente, não tenho dúvida, devo acordar estranho de novo, virou rotina, eu me acostumo, já é normal. e se assim for, e que assim seja, pois é incontrolável e insustentável, mas é gostoso. escreverei pela manhã, como o fiz hoje, enfiarei todas as minhas angústias, as minhas manias e as minhas esquisitices na bolsa de couro velho, como faço todos os dias, e colocarei também alguns rascunhos, algumas balas, algumas contas, algumas cartas e a incerteza do meus dias, de todos eles, do meu agora, do meu hoje, do meu ontem, respirar fundo, olhar para a frente, e começar tudo de novo.

Um comentário:

  1. ... e paris continua linda, mas me parece muito mais inspiradora agora, seus mistérios sao reflexos dos tesouros que guardamos dentro, que nem sabemos que guardamos, mas que reconhecemos imediatamente como o mais puro de nos quando se revelam....

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